«Miguel Palma» in AA.VV, Centro de Arte Moderna José de Azeredo Perdigão: Roteiro da Colecção (pp. 178-179). Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2004. ISBN: 972-635-155-3
Miguel Palma nasceu em Lisboa, em 1964. Estudou na Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa entre 1984 e 1986. Na primeira fase da sua carreira artística, na segunda metade dos anos oitenta, ele adopta preferencialmente o betão e o ferro para desenvolver em escultura um trabalho que interpreta nas formas dos objectos realidades portadoras de um sentido estético. Assim, em 1989, quando realiza a sua primeira exposição individual na galeria Quadrum, propõe uma instalação intitulada Ludo, na qual estão presentes uma série de peças que reproduzem artefactos e equipamentos associados a determinados jogos e divertimentos. Durante a década de noventa Miguel Palma continua em parte a realizar peças escultóricas usando os mesmos materiais, e paralelamente começa a produzir um grande número de trabalhos que se destacam pela criação de engenhos pouco convencionais. Neste conjunto de trabalhos encontram-se obras como Olho Mágico (1993), estrutura de grande formato, cujo impacte deriva da sua aparente proximidade ao campo da engenharia e da indústria tecnológica, e Engenho (1993), protótipo de um veículo automóvel construído e mais tarde conduzido de Lisboa ao Porto pelo artista, em 29 de Julho, para a inauguração da exposição Imagens para os anos 90 (Fundação de Serralves, 1993). Esta acção tem um especial significado no conjunto da sua obra do artista, remetendo-nos para uma componente que Palma passa a desenvolver com frequência nos seus trabalhos. Essa dimensão está muito presente, por exemplo, nas acções que concretiza em esferas da actividade humana não directamente associadas à produção artística. É assim que é conveniente situar uma das suas intervenções recentes, Prova de Artista (2001), em que o ele participava numa competição do calendário automobilístico, o Campeonato Nacional de Velocidade – Clássicos Históricos (71), tendo usado mais tarde o espaço da galeria Cristina Guerra para expor o projecto. No contexto da mostra apresentava uma performance e diferentes peças de exposição, entre elas cenários e acessórios relacionados com a prova, mas também vídeos que evocavam as diversas etapas e certos acontecimentos marcantes da sua experiência vivida.
Semelhante dimensão experimental verificou-se também numa exposição realizada no Museu do Chiado, intitulada Exposição de Ocasião (2000). Nessa mostra, Palma fornecia informação sobre uma intervenção artística que visava a venda de obras suas, antigas e recentes, expondo um conjunto de materiais onde se incluiam os anúncios comerciais publicados em diversos títulos da imprensa diária e semanal, e o registo áudio de conversas telefónicas recebidas pelo artista durante a exposição, que tinham o interesse de revelar as expectativas e as reacções dos potenciais interessados na compra dessas peças.
Na colecção do CAM a produção artística de Miguel Palma está representada pela obra Cemiterra-Geraterra, escultura em ferro situada no jardim da Fundação Calouste Gulbenkian, a que está associado um projecto de instalação muito particular, o qual abarcou o período de 1991 a 2000, ano em que Miguel Palma resgatou um paralelepípedo enterrado dez anos antes, que guardava no interior um globo terrestre. Nesta obra, o autor sugere visões da relação do homem com o mundo exterior, ocupando-se, simultaneamente de algumas questões fundamentais da prática escultórica, nomeadamente o conceito de monumento, a relação entre escalas de grandeza, e entre o volume e o espaço, remetendo-nos ainda para outros princípios, como seja a deslocação espacial, a transição entre interior e exterior, e a dimensão temporal, que encontra expressão em muitas das suas obras. Um exemplo são as réplicas e antiguidades que Palma recupera em múltiplos contextos, para desenvolver por seu meio perspectivas relacionadas com a experiência de passagem do tempo: veja-se as peças de mobiliário e os automóveis de colecção (respectivamente um modelo Morris Mini de 1968 e um DKW de 1939) que incluiu em duas recentes mostras individuais, Mini Mind (Círculo de Artes Plásticas de Coimbra, 2002) e 1/1:1250 (Galeria Graça Brandão, 2003), onde estabelece diferentes associações entre passado e presente e torna a prática do coleccionismo a referência central de muitas das criações expostas.