«Helena Almeida» in Más que Vanguardia. Arte Portugués entre dos Siglos - Fondos de la Colección Moderna / Museo Calouste Gulbenkian, Lisboa. Burgos: Fundación Caja de Burgos, 2016. ISBN: 978-84-92637-91-1
Helena Almeida realiza em 1967 a sua primeira exposição individual. Antes disso a artista já vinha mostrando em exposições colectivas, a partir de 1954, pinturas de carácter figurativo. É uma fase da sua obra que não tarda a abandonar, determinação a que não será alheia a sua passagem por Paris em 1964-65, onde permanece um ano na condição de bolseira da Fundação Calouste Gulbenkian. Fruto das novas pesquisas abstracto-geométricas destes anos são os quadros que expõe em 1967 na Galeria Buchholz. Nessas obras, as figuras geométricas ocupam o espaço pictural formando uma multiplicidade de planos, e numa delas dispõe-se um dos seus rectângulos de modo a sugerir uma tira a deslocar-se do suporte. Se neste momento Helena Almeida ainda trabalha apenas ao nível do espaço ilusório da tela, preocupada com a representação dos volumes, a negação do espaço bidimensional, ideia-base da fase posterior, estava aí prenunciada. Com efeito, nos dois anos seguintes e na mesma galeria, a artista expõe obras que aprofundam os valores da objectualidade. Nelas podemos observar elementos pictóricos volumetrizados saindo do plano para o espaço real. Dos mesmos anos são também as séries de quadros onde a artista expõe os versos da tela numa atitude de clara negação do suporte enquanto dispositivo representacional, chegando mesmo a apresentar um quadro antropormofizado.
Nos desenhos a tinta da china com colagem de fio de crina saem da superfície branca do papel linhas verdadeiras, traçadas manualmente as de tinta, coladas ao suporte as de fio. Num jogo de ambiguidades, Helena Almeida apresenta nas suas obras dois tipos de desenho, ou melhor, conjuga formas antagónicas de realizar um desenho: uma prática de desenho «tradicional» e uma prática de anti-desenho. O seu desenho «académico» constitui um verdadeiro desenho traçado, no qual as linhas são traçadas num plano com materiais como a tinta da china. Já no domínio da colagem ela explora as potencialidades de um desenho volumétrico, construído com materiais físicos. Estes desenhos mostram então, lado a lado, as linhas plásticas e o objecto real que é dado figurarem. Note-se que esta ideia é sugerida com grande eficácia, pois não se concretiza somente em desenhos-esculturas; dispondo-se na continuidade das linhas desenhadas, os fios de crina parecem evocar o processo da sua transmutação ficcional. Explorando novos meios de expressão baseados na articulação de planos pictóricos e volumes, Helena Almeida estabelece assim uma ponte entre a pintura e a escultura. É uma relação que, na sua produção artística, surge escorada numa permanente preocupação ao nível do entendimento das próprias leis de figuração e na representação enquanto forma de desconstrução do acto de criação artística.